quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Folha do Estado

Fiquei impressionado
lendo a Folha do Estado.
Tudo estava invertido,
todo contexto trocado,
chegou a ser divertido,
pensei: tem algo errado.

Na primeira manchete
sonhadores enlatados
batiam novo recorde.
Fato que se repetia
dia após dia,
mas que enfim era mostrado
e cobrado como se pedia.

Um neto de dona Maria
era nome principal
do festival cultural que aconteceria
em nível nacional,
com TV cobrindo e tal,
diretamente da periferia.

No editorial da edição
o assunto era especulação,
desapropriação sem direito a informação.
Citavam nome por nome
de cada um dos empresários,
aos quais chamavam de incendiários.
Foi realmente hilário,
coisa que nunca vi antes,
o jornal sem anunciantes.

Tudo me surpreendia,
nunca pensei que um dia
criariam um caderno só de poesia
com o Casulo na curadoria.
Publicaram até uma minha,
mano que alegria,
tamanha que em mim não cabia.
Havia uma matéria gigante
sobre poetas ambulantes
que alegram os coletivos
em pleno horário de pico.

O painel do leitor
dava voz ao trabalhador.
Um reclamava da astronômica
conta enviada pela Telefônica.
Outro falava da internet,
dizia com todas as letras
“maldito mundo dos Nets”.
Um outro tirava o sarro:
“Claro, não está bem claro.
Veio muito mais caro,
comprei um celular ou um carro?
Mandem a conta correta,
façam como o Ronaldo
a tal da medida certa”.

Tinha reportagem especial
sendo visceral ao descrever
a importância de cada Sarau
para a periferia amanhecer
no sentimento de revolução,
que aquece cada coração
bombeado de esperança
com força de gigante
e sorriso de criança.

As estatísticas seguiam a crescer,
dava até gosto de ver.
Cada vez mais gente lendo,
escrevendo, versando,
cantando fora do banho,
conversando com estranhos,
falando sozinhos,
experimentando novos caminhos,
novos carinhos.
Largando o emprego e abraçando sonhos.
Enfrentando seus medos
e seus tabus medonhos,
sem se preocupar com o enredo
ou com a direção do rebanho.
Quebrando paradigmas,
derrubando muros,
desvendando enigmas
antes tão obscuros.

Entre tantos enfoques,
anteriormente desfoques,
um ganharia destaque:
O caso do fiel ateu
que saiu da igreja em busca de Deus,
pisou descalço no chão,
inflou de ar o pulmão,
então, olhando para o céu
sentiu a energia dos seus.
Na tempestade que ali desabou,
em seu peito que inteiro inundou,
encontrou o que nunca perdeu.
Rapidamente se converteu.

Enriqueciam o diário
colunistas de renome
como Roberta Estrela D’alva,
e Daniel Minchoni.
O Vaz, num artigo sagaz
aconselhava: leiam dentro Buzo.
Enquanto o Alessandro
falava de palavras em desuso
como ódio, inveja, vingança
e outras tantas, que usar me recuso.

A título de esclarecimento,
aos que não botavam fé
naquilo que estavam lendo,
havia no rodapé
uma nota curta, dizendo:

O mundo continua o mesmo.
Investe-se mais na economia
do que em barrigas vazias.
O Dólar segue subindo,
o Real continua caindo.
Os políticos de mãos atadas
servem a iniciativa privada.
A maioria reclama na sua,
a minoria apanha na rua.

Enfim, tudo segue normal.
Com exceção desse jornal
que de hoje em diante
só publicará notícias
que tornem o mundo mais relevante.

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